Retrato do transporte rodoviário de cargas revela um ano sombrio
dezembro 21, 2023Transportadores avaliam que o ano de 2023 ficou abaixo do desejável, por conta dos aumentos de custos e outros fatores que podem se repetir no ano que vem.
Um ano considerado instável. Assim, ficará marcado o ano de 2023 para parte dos transportadores que atuam no mercado de fretes rodoviários. Como apontou o estudo feito por Frota&Cia junto a empresas e entidades do setor, para compor o Panorama 2023/2024 do Transporte Rodoviário de Cargas, que fecha o conjunto de edições do ano da publicação.
Prova da afirmação aparece nos números que ilustram o “Boletim de Conjuntura Econômica” da Confederação Nacional do Transporte (CNT), organizado a partir de dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística(IBGE). Depois de oito trimestres consecutivos de alta, o PIB do setor de transporte acusou queda de 0,9% nos 3º trimestre do ano. Com esse resultado, o acumulado de janeiro a setembro de 2023 acusou uma expansão de 3,5%, abaixo da inflação medida pelo IPCA no período, que foi de 3,75%.
“No início do ano, tivemos uma performance bastante robusta, em função da melhoria tarifária obtida junto aos nossos embarcadores. Porém, esse crescimento recuou no segundo semestre, como resultado de uma concorrência muito exacerbada em nosso mercado”, confirma Urubatan Helou, presidente do Grupo HP, controlador da Braspress.
Sérgio Pzichoz, diretor de Operações da SVD Transportes, relata que o mercado de fretes rodoviários enfrentou desafios substanciais em 2023, principalmente em função da combinação de fatores econômicos e políticos complexos. Como exemplos, ele cita a falta de investimentos no setor agrícola, apesar do recorde de safras. E ainda os conflitos mundiais como a guerra entre Rússia e Ucrânia e na faixa de Gaza, que impactam nos preços do petróleo.
A PROVA DOS NÚMEROS
A afirmação tem o aval do assessor técnico da NTC&Logística, Lauro Valdívia, com base em uma pesquisa realizada pela entidade junto aos associados. “Enquanto 28,2% dos entrevistados afirmaram que 2023 se mostrou melhor que o ano anterior, outros 18,5% disseram que os dois períodos tiveram comportamento parecido e nada menos que 53,3% relataram que esse ano foi pior que 2022”.
“O segmento vem passando por fortes pressões em relação aos custos acumulados desde a pandemia, os quais não foram absorvidas pela indústria e afetam diretamente a saúde financeira dos negócios”, admite Ricardo Navarro, diretor comercial da Ativa Logística.
No esforço de compensar tais perdas, algumas empresas projetam encerrar o ano com saldo positivo, porém, graças às medidas internas adotadas para ampliar receitas e reduzir os custos. “Nossa expectativa é fechar o ano com um crescimento de 11% na receita e 9,4% na movimentação de volumes”, afirma Paulo Nogueirão, diretor Comercial e de Marketing de Jamef, em alusão aos investimentos realizados na Nova São Paulo, novo centro logístico inaugurado em Osasco (SP) e a abertura de novas bases operacionais.
LEI DO MOTORISTA
Além desses fatores, o segmento do transporte de carga acusou outros reveses em 2023, que vem contribuindo para a redução de performance e da rentabilidade das empresas. É o caso da alteração na Lei do Motorista, aprovada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que declarou diversos trechos como inconstitucionais e estabeleceu novas normas de conduta. Como a obrigatoriedade do descanso de 11 horas, a jornada limitada a 8 horas por dia, o repouso semanal a cada sete dias e a proibição de dividir a direção com outro motorista na boleia, entre outras exigências.
“Acreditamos que as pessoas preferem usufruir suas folgas em suas casas. Agora, porém, terão de descansar em locais distantes das suas famílias, para atender às novas exigências”, ressalta Valdir Fontanella, da Fontanella Transportes. “Todas essas alterações tem acarretado alterações significativas na rotina das empresas, contribuindo para a elevação dos custos e a redução de nossa área de atuação”.
Para os que operam em linhas internacionais, a revisão na Lei do Motorista deve prejudicar a competitividade frente às empresas de outros países que prestam os mesmos serviços, mas que possuem menores obrigações tra- balhistas. Além de questões pontuais relacionadas à situação da Argentina.
SEGUROS DE CARGA
De volta ao Brasil, os transportadores também reclamam das mudanças ocorridas na contratação de seguros, com base na Lei 14.599, de 19 de julho. A nova regra legal revogou a eficácia da Carta de Dispensa de Direito de Regresso (DDR), um acordo bilateral que anteriormente isentava ou compartilhava os riscos do transportador em relação a sinistros. “Agora o transportador assume plena responsabilidade em casos de roubo ou furto de carga”, alerta Sérgio Pzichoz, da SVD Transportes.
“Essas mudanças representam um potencial aumento significativo nos custos para os transportadores, uma vez que, agora, estão obrigados a contratar três modalidades distintas de seguros de responsabilidade civil para os prestadores de serviços no transporte rodoviário de carga”. Na tentativa de cobrir esses novos custos, a NTC&Logística sugeriu a inclusão de mais um componente tarifário (TSO – Taxa de Seguro Obrigatório) na tabela de frete, observa o assessor da entidade, Lauro Valdívia.
RESSALVAS
Não sem motivo, os entrevistados vêm com ressalvas o ano que está por vir. A percepção geral é que as perspectiva para 2024 são inquietantes, devido à conjunção de fatores adversos, tanto interno quanto externamente. Na visão de Paulo Nogueirão, da Jamef, as expectativas para o mercado de cargas fracionadas serão bem desafiadoras no próximo ano. “Muitas projeções mostram um PIB de 1,5%, com a maior parte desse crescimento voltada ao agronegócio. Temos uma Selic que segue alta, o que pode ocasionar retração de consumo e de investimento”.
“O transporte rodoviário de carga é uma atividade de meio e é altamente dependente do desempenho da economia”, rebate Lauro Valdívia de outro lado. Segundo ele, a depender do segmento, a variação do PIB do setor é de duas a três vezes a variação do PIB brasileiro (valendo para o positivo e o negativo). “Dessa forma, temos perspectivas diferentes a depender do segmento. Mas, no geral, o transportador não está muito animado com o futuro: só 17% acreditam em uma melhora, já para 40% a economia deve piorar nos próximos anos” alerta.
Por: Redação